Papo de escritor

Papo de escritor

junho 25, 2016

Hoje o papo de escritor é com Wladimir Cazé


Wladimir Cazé nasceu em Petrolina (Pernambuco) e viveu muitos anos em Salvador (Bahia). É graduado em Comunicação Social pela UFBA e mestre em Letras pela UFES, com pesquisa sobre tradução literária. Mora em Vitória desde 2009. Publicou os livros de poemas Microafetos (2005) e Macromundo (2010), além de folhetos de cordel.

1-Qual o livro mais marcante que já leu até hoje?

É difícil responder a essa pergunta. São muitos os livros marcantes. Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, é um sério candidato ao primeiro lugar na minha lista, por sua potente conjunção de poesia e narrativa. Mas quero também recomendar a leitura de dois clássicos que me marcaram e são divertidíssimos, um brasileiro e um italiano: A pedra do reino, de Ariano Suassuna, e Decameron, de Giovanni Boccaccio.

2-Houve um momento em que você percebeu que seu destino era ser escritor?

Desde criança sempre tive muito contato com livros, revistas e jornais em casa, e o interesse pela leitura e pela escrita surgiu naturalmente. Lembro de começar a escrever histórias em quadrinhos, por puro exercício lúdico, e de em algum momento passar a escrever textos mais longos, mas sem maiores pretensões a não ser me divertir. Depois de muita leitura de Monteiro Lobato no fim da infância, descobri no começo da adolescência o Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto. E logo passei para Dom Casmurro, de Machado, para a poesia de Manuel Bandeira, para Rubem Fonseca, etc. A necessidade de me expressar por meio da escrita nasceu dessas leituras iniciais e com o tempo se tornou algo mais sério e fundamental, levando-me a escolher a profissão de jornalista. Hoje eu diria que sou um escritor não-profissional: a literatura tem uma presença central na minha vida, estou o tempo todo pensando em literatura e eu a considero minha principal atividade, mesmo quando estou me dedicando muito mais à leitura do que à escrita propriamente dita, como é o caso atualmente.

3-Há alguma atividade cotidiana que pode ter levado você a querer contar histórias? Qual/quais? Como surgem ideias para escrever um livro?

A quebra da rotina costuma ser a mola propulsora mais frequente para o nascimento de um texto novo. Também me inspiram ocorrências do dia-a-dia, viagens, fatos históricos, lugares, minha mulher e música. Em geral o texto começa com uma anotação breve, uma associação de ideias ou de palavras, que depois será ampliada e reelaborada exaustivamente, até que um resultado satisfatório seja alcançado.

4-Que dicas daria para quem está começando a escrever um livro?

Leia muito, leia sempre, leia cada vez mais. Leia os clássicos e os bons autores vivos. É importante ler também crítica literária, pois isso permite perceber como uma obra literária pode ser analisada e “desmontada” para ver como funciona, como qualquer objeto construído pelo ser humano. Quando estiver escrevendo, não tenha pressa de publicar seu texto. Uma obra literária de qualidade leva tempo para ficar pronta, às vezes muito tempo, exige muita leitura e releitura, muita reflexão e reescrita. Muita paciência. É importante, antes de publicar, mostrar seu trabalho para alguns leitores-cobaia, que vão poder fazer sugestões, críticas e comentários úteis no aprimoramento do seu trabalho.

5-Quais são os seus autores favoritos?

Com certeza posso citar Franz Kafka, João Guimarães Rosa, Manoel de Barros, João Cabral de Melo Neto, Julio Cortázar, Jorge Luis Borges, Italo Calvino, Murilo Mendes, Haroldo de Campos, James Joyce, João Gilberto Noll, Thomas Bernhard, W. G. Sebald e Antonio Torres. Mas ficam faltando muitos outros autores que me fascinam. E toda semana aparecem outros, do passado e do presente (tem muita gente boa escrevendo hoje nesse Brasil afora).

6-Quanto tempo demora para escrever um livro?

Demoro bastante tempo. Meu primeiro livro de poemas, Microafetos, foi quase todo escrito entre 1996 e 2002, ou seja, levou pelo menos seis anos. E ele não chega nem a ter 2.000 palavras no total (poesia é síntese)! Para esse livro escrevi muitos e muitos poemas curtos, e no final selecionei apenas os que considerei serem os melhores: dos 200 escritos, foram para o livro 46 textos.

7-Quais são os seus planos? Próximo projeto?

Estou, já há bastante tempo, às voltas com um experimento de ficção em prosa poética. Conta a história de um habitante do sertão nordestino que migra para uma grande metrópole pós-industrial. Inicialmente essa foi a forma que encontrei para digerir os três anos e meio que vivi em São Paulo. Mas, com o avançar do trabalho, o projeto se tornou mais complexo e ambicioso. Já tenho várias páginas escritas, estou sempre pensando sobre esse livro e lendo coisas relacionadas a esse projeto. Tenho pesquisado, de forma muito livre e indisciplinada, sobre a história das migrações nordestinas pra São Paulo, a história de São Paulo, a história das secas, a história do Nordeste... São pesquisas que me dão elementos para a escrita, mas ainda estou, aos poucos, desenvolvendo o texto da maneira como tenho em mente.

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